terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Bagunça

As palavras vem sem sentido
Os sentidos entorpecem sem razão
A razão foi-se embora à muito tempo
E o tempo se embaralha na sua falta
A falta insiste em ser presente
O presente se arrasta devagar

E divagando vou buscando palavras que façam sentido pra entender a razão de passar tanto tempo sentindo sua falta sem poder te presentear com o resto de luz do universo que não te pertence.

Sem sentido
Sem razão
Sem sono
Sem chão
Sem luz
Sem tesão
Sem estrutura, coerência ou coesão

Está tudo uma bagunça
Uma bagunça








Tal qual a poesia...
 

quinta-feira, 14 de outubro de 2021

L i E s

Sometimes             we
    LIE    
            to                                 protect
something

                                                                                                                    But

                                LIES                                can
hurt
                more
                                than
the
                                                                                motive.

Amor doação...

Menos de 48h atrás estava conversando com amigos sobre temas profundos, quando um deles citou o termo "amor doação", e esse termo me vestiu como algo feito sob medida. Eu me via totalmente e profundamente descrito por ele, mesmo sem nem saber se o entendo por completo. Como se eu estivesse nas paginas escritas por Patrick Rothfuss, mas ao invés de saber o nome do vento eu sabia o nome do "amor doação"...

Lembro do meu amigo citando Papa João Paulo II, mas não sei o que o mesmo disse a respeito. Mas a compreensão superficial aparentemente foi a mesma do falecido pontífice, o amor doação é quando o sentimento guias suas escolhas sempre pelo outro...

O amor parental costuma ser assim, onde os pais, se doam por completo aos filhos... Mas eu não tenho filhos, ainda assim "amor doação" me descreve... Porque simplesmente, quando eu amo, o outro passa a ser o centro do meu universo, e isso não é passível de uma escolha... Não importa o que aconteça comigo, a felicidade do outro é mais importante... Isso não quer dizer que eu não me ame, eu me amo pra caramba, mas nunca vou me amar mais do que amo o outro... Também não quer dizer que eu não sofra... Ah, como eu sofro... Mas eu escolho sofrer pelo bem do outro... E por mais destrutivo que isso seja, é a única maneira que existe pra mim...

"Amor doação"... Meu amar é se doar... E não está tudo bem... Mas de alguma forma vai ficar... 

quarta-feira, 17 de março de 2021

O que é o Amor?

Se me perguntarem o que é o amor,
Direi sem nem pestanejar:
Amor é aquele minuto e meio que olhei pra ela...
Aquele entre tantos outros impressionantes iguais... 
Mas este que ela sentada na cama encostou na parede...
E seus cachos caíram sobre seus ombros como cachoeira...
Com o contraste da mecha estranha, que eu amei... 
Aquele minuto e meio que me esforcei pra ouvi-la...
Cada palavra que ela emite é como o tesouro mais precioso...
Mas aquela visão me arrebatou, me tirou o ar... 
Passaria toda a eternidade feliz apenas admirando sua simplicidade...
Era como ver um dos significado da perfeição...
Todos os outros significados também envolvem ela...
E mais uma vez eu soube, e uma estrela no céu brilhou concordando...
Isso é amor!

Desculpa pelos versos tristes

O pior poeta, só escrevo melancolia,
Talvez para quem leia seja um tormento,
Juro que também faço versos de alegria,
Mas me envolvo e perco o momento.

As palavras se tornam um meio de fuga,
Olhando dessa forma me sinto um ingrato,
Pois me salvam quando a tristeza suga,
Mas na alegria esqueço do onde me trato.

Queria ter mais versos de amor,
Daquele tipo que aquece o coração,
Mas meu peito suporta tanta dor,
Transbordando sem nenhuma explicação.



Difícil

É tudo tão difícil as vezes... Queria que fosse fácil... Queria o riso leve... Mas as lágrimas pesadas aparecem com mais facilidade... E eu juro que tenho feito de tudo pra não ficar assim... Tento focar na paz que o futuro me trás... Mas o presente é o que complica... O presente é cruel... Mas não há ninguém cruel... É apenas a conjunção de fatores que se organizaram  com requintes de crueldade...

Como posso me sentir tão perdido agora??? Mesmo depois de ter meu futuro revelado... Mesmo sabendo que o que meu coração mais deseja foi colocado pelo ser superior em algum momento do meu destino... Mesmo com a paz desse saber inundando meu coração... Porque não consigo ficar em paz comigo mesmo???

E se um dia achei que a mágoa ou a raiva dela seriam os sentimentos mais difíceis de suportar... Como estava eu enganado... Hoje sei que nada machuca mais que a indiferença... Não uma indiferença comum... Mas a indiferença de quem já se recebeu amor... De quem se sentia mais do que ouvia ou via... Do brilho nos olhos que eu sabia que estavam lá por minha causa... E de repente perceber que não estão mais lá... Acabados ou suprimidos, não importa na verdade... 

Mas caro leitor, não se preocupe... Se é que existe um leitor aí... Mas se existe, não absorva minha tristeza... Ela vai passar... E tenho certeza que o futuro será brilhante... E terá o brilho que tanto sinto falta agora... Vai passar... Vocês vão ver... Eu também verei... Pena que mesmo sabendo disso ainda dói tanto... Ainda machuca demais... É a vida... Ela é difícil...

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Devaneios Furados XX

Cancela o Devaneios XIX!!! Ontem foi um dia bom... Um dos melhores no mês pra ser sincero... E aquilo que pensei e disse no Devaneios anterior já não me vestem mais no momento... Não que sejam mentiras aquelas palavras... Apena não se encaixam mais no meu coração... Pelo menos, não até o próximo dia ruim.. Mas eu sinceramente espero que ele não venha, ele não tem porque vir... Eu posso impedi-los de vir, sei que posso, e isso não é papo de coach... 

Falei que o luar só trazia uma esperança vã, e não tinha nada de mágico... Nunca estive tão certo e tão errado... O luar realmente não trás nada de mágico... Mas ele nos ensina todo mês a mágica de olhar a parte certa da vida... "Hoje a lua está quase cheia... Mas é linda no quase... Não precisa ter pressa pra chegar lá... O que antecede ainda pode ser muito bom!!!"... Estou citando a mim mesmo num momento de devaneio anterior... E foi exatamente isso que o dia de hoje me ensinou, ou me relembrou... 

Tenho em mim, que talvez não seja a primeira vez que escrevo algo parecido... Mas nossa mente é frenética demais pro seu próprio bem... Ela sempre encontra uma maneira de nos destruir... Autodestruição é mais comuns em humanos que em robôs... Naquele momento, no Devaneios XIX, minha mente havia me destruído... Não foi uma situação, ou um sentimento, foi minha própria mente... "Mas tão fácil como nossa mente nos destrói, as palavras certas vindas da pessoa certa nos reconstroem ainda mais fortes"... Outra autocitação porque ontem foi um dia bom...

E assim vou seguindo novamente... Reconstruído e forte... Tentando não pensar muito no fim do caminho... Aproveitando mais o próprio caminho... Pois a vida pode nos reservar belas surpresas, até mesmo nos momentos que parecem mais dolorosos... Poderia me perguntar se o mesmo aconteceu antes, mas não percebi por focar na dor... Mas esse seria outro erro que busco não cometer novamente... O passado já foi, o futuro está sempre inalcançável, toda e qualquer beleza só pode ser apreciada no presente...



quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Poesia Vazia

Queria escrever versos de amor,
Na solidão me pus à escrever,
Mas nas palavras só se encontra dor,
Amar sozinho é igual a sofrer,
A poesia perde assim seu fulgor,
Fica confusa e difícil entender,
Mas nesse assunto já sou professor,
Após esse verso vou sobreviver.

Devaneios Furados XIX

Admirar o luar quase sempre trás um calor ao coração, uma esperança de que o melhor estar por vir e as coisas vão dar certo. Porém essa esperança sempre se torna vã. Nenhuma melhora vem do prelúdio da lua, E provavelmente de nenhum outro lugar... Toda e qualquer mudança positiva vem de um longo e doloroso processo onde somos os únicos responsáveis... E não, isso não é um texto de autoajuda...

A esperança é algo cruel... Nos faz crer que algo mágico vai acontecer no fim... Que o sofrimento será recompensado com algo maravilhoso... Mas é tudo uma grande porcaria de mentira... Acasos podem acontecer... Mas nada será por magia, destino ou milagre... Num mundo onde tantos morrem sem conhecer o amor, por que você seria tão superior ao ponto do universo ou seu regente preparar algo especial apenas pra você?

E o pior é saber que sem esperança, sem essa mentira doentia que brota dentro da gente, ficaremos congelados na nossa própria inércia... A maldita esperança que nos trás tanto sofrimento em suas frustrações, é também o que nos move... É o que nos faz buscar o algo melhor... Lutar pelos nossos sonhos, mesmo sendo ridiculamente impossíveis... E é assim que nós causamos as mudanças na nossas vidas... Não o universo ou o o regente do universo, que no máximo te indicam a direção... Nós... Sozinhos, sofrendo, e sem nenhuma garantia que será a mudança que queremos... 

E assim seguimos... Sofrendo... Chorando... Esperando... Mudando... Pelo menos ainda temos o falso alento do luar... 



domingo, 21 de fevereiro de 2021

Primeiro Amor

Foi a primeira vez que a viu em anos, e ela continuava deslumbrante. Seus cabelos ruivos em cachos bem arrumados, muito diferente de quando se encontraram pela primeira vez. Quanto tempo fazia desde aquela primeira vez? Parecia ter sido em outra vida, mas poderia ter sido ontem. É difícil saber ao certo o momento que se conhece o primeiro amor. 

Ele era apenas uma criança do ensino fundamental quando a casa ao lado da sua ficara pronta, para o alívio da sua mãe que reclamava muito da poeira da construção que sempre parava sobre os móveis. Algumas semanas depois eles chegaram, a família Simões, eram três. A mãe, Dona Fátima era como a chamávamos, era uma mulher de pouca estatura com um cabelo loiro que batia nos ombros, muito simpática e sorridente com os vizinhos. O pai, Seu Gusmão, era alto e forte, ostentava uma careca branca que não era comum pra idade dele, e sempre saia cedo e voltava tarde do trabalho, o cansaço por vezes visível em sua expressão. E a filha, Sarah.

Sarah tinha a mesma idade que ele, porém era pouca coisa mais baixa. Cachos ruivos se avolumavam sem nenhum controle sobre a cabeça, os olhos verdes sempre demonstrando uma sagacidade incomum pra idade, os lábios formavam um coração rosado que guardava um sorriso capaz de derreter um iceberg. E ao vela se mudando pra casa vizinha, já sentia uma felicidade no peito que levara anos pra perceber que se tratava de estar apaixonado.

Não demorou muito pra ele e Sarah se tornarem bons amigos. Frequentavam a mesma escola, inclusive era comum estarem na mesma classe. À tarde, por obrigação, faziam o dever de casa e depois iam brincar juntos. Sarah costumava brincar com os outros meninos da rua com mais frequência do que com as outras meninas. Ela dizia não ter paciência para as brincadeiras de meninas. Sarah vivia com o rosto e as mãos sujas, além de ser comum vê-la com escoriações nos joelhos e cotovelos. As mulheres da vizinhança diziam que ela parecia mais um menino que uma menina.

Para ele nada disso importava, Sarah se tornou rapidamente sua pessoa favorita. Queria estar sempre com ela, e tentava aproveitar os momentos juntos pelo maior tempo possível. E quando os hormônios vieram, passou a olha-la de uma maneira nova, e os imaginava nas cenas apaixonadas que via nas novelas. Mas foi após assistir um filme que tomou uma decisão e pediu ao seu pai para lhe colocar numa escola de musica, para aprender a tocar violão.

Meses se passaram, sua dedicação era visível e todos os adultos o elogiavam por aquilo. Mas a dedicação não era pelo amor à musica, ou ao instrumento em si. Ele tinha um plano, e decidira que seria daquela forma que o executaria, e assim mergulhou de cabeça no novo aprendizado com apenas esse objetivo em mente, focado no momento que em breve chegaria, e chegou na primavera seguinte.

Ele queria que tudo fosse perfeito, e planejou tudo com antecedência. Os meses de dedicação garantiriam que não estragasse nada naquele momento. E assim, naquela manhã de sábado, bateu na porta dos Simões e chamou Sarah para brincar como de costume. Ela saiu e mostrou certo espanto ao ver o violão que o garoto trazia consigo, mas não o questionou e o seguiu na expectativa das brincadeiras do dia. e assim foram pro jardim da igreja, que era grande e pouco movimentado, 

Ele a levou até um banco do jardim, pegou o violão, e com as mãos suadas e tremulas começou a tocar a música que tanto ensaiara, o motivo pra toda sua dedicação, a música favorita de Sarah, "Let it Be" dos Beatles. Após finalizar a canção olhou no fundo dos olhos verdes dela e se declarou. E para sua alegria, Sarah retribuiu a declaração, pois ela também já gostava dele de uma forma diferente. A alegria estampada em ambos os rostos juvenis era linda de se ver. E assim selaram a maravilhosa descoberta com um beijo, que apesar de não passar de um selinho, fora a melhor coisa que os dois haviam vivido até então.

Na manhã seguinte, ele acordou ainda mais animado. Agora tinha uma namorada, e era a Sarah! Ele estava namorando a menina mais bonita que já viu na vida, e a vida era simplesmente maravilhosa. Mas ao bater na casa de Sarah sentiu que algo não estava certo. A casa parecia sem vida e vazia. Depois de bater mais de três vezes e não ter nenhuma resposta, finalmente Seu Gusmão saiu olhou para cara dele com uma fisionomia nada agradável apenas disse que Sarah não estava lá, antes de bater a porta da casa. Mais tarde descobriu que a Dona Fátima tinha separado do Seu Gusmão naquela noite, e se mudado da casa, levando Sarah consigo.

E assim eles nunca mais teriam se falado até que algumas semanas atrás ele recebeu uma mensagem, Sarah o achara na internet de alguma forma. Eles conversaram bastante online e ela o convidou para aquele momento. E naquele momento, em que ele a vira novamente depois de anos, ela estava deslumbrante. Ela possuía uma beleza natural que era estonteante, e isso só melhorava com toda a produção para o casamento. Sarah era de longe a noiva mais bonita que ele jamais viu e Eleanor era uma mulher de muita sorte por se casar com ela. 

 



sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Devaneios Furados XVIII

Estou no limite novamente! Ele sempre chega em algum momento... Normalmente ele se afasta pelas pequenas doses de alivio que recebo em dias bons... Mas se aproxima em dias ruins, quando minha guarda fica mais baixa e meus pensamentos mais ferinos... E assim só é necessário um pequeno gatilho pra me fazer transbordar... Eu tento evitar, segurar, mas mal consigo esconder... A dor do peito escorre por um rosto triste... 

Eu não queria que acontecesse... Tento convencer minha mente de que não há motivos para tal sofrimento... Mas como convenço meu coração do mesmo? Como posso controlar aquilo que sinto, quando por mais de 20 anos tem sido os sentimentos que me controlam? Como diria Medulla, não sei como parar de amar, e nem sei se devo tentar... Pois o amor tem essa faceta, é ao mesmo tempo aquilo que me destrói e aquilo que me reconstrói, me repara e me indica o caminho... 

Não trocaria tal sentimento por nada, mas não o recomendo à ninguém... A dor no peito é demais, mesmo com anos de vivência, nunca estou realmente acostumado... E não há nada para evita-la... Enquanto houver a peça faltando, haverá a dor... E eu só posso abraçar a dor, deixa-la transbordar, torcer pra que os dias bons retornem logo e confiar que um dia ela não estará mais presente... Mas no momento, apenas cheguei no meu limite novamente... E transbordo...

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Bagunça do coração.

Observo pela janela, a beleza das estrelas.
As nuvens são levadas, no vento de incertezas.
A musica tocando, é na caixa ou no coração?
Feliz daquele que transforma, o poema em canção.
Pensamento buscando ela, como sempre se inicia.
A torrente de palavras, chamada de poesia.
Vem do peito o desejo, a vontade incessante.
Desejo de estar junto, a sensação inebriante.
Bagunça de palavras, não faz nenhum sentido.
Impossível transcrever, amor que é transmitido.
Privado do seu cheiro, e também de lhe tocar.
Inveja do cobertor, pois não posso lhe esquentar.
A distância entre nós, deixa a vida mais sombria.
Só queria estar contigo, nessa madrugada fria.
Distância aperta o peito, a saudade faz pressão.
Não importa o quão longe, estás em meu coração.
Perdido como meu sono, não sei mais o que eu faço.
Apenas envio minha alma, para em ti dar um abraço.
Um pouco do meu calor, na esperança que te aqueça.
E todo o meu amor, para que nunca me esqueça.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

A dama, o lago e o caos.

Era uma noite quente de verão, dormir era difícil mesmo com o ventilador na velocidade máxima. Vou arrumar um ar condicionado! pensou, mas sabia que passaria mais um verão sofrendo com o calor. Então simplesmente desistiu, levantou, bebeu um copo de água gelada e ficou à admirar a noite pela janela. Era uma noite sem luar e sem nuvens, as estrelas reluziam com força no firmamento, se reduzissem as luzes da cidade seria possível ver os traços da galáxia em meio ao cosmos. E como se a visão pela janela não fosse o suficiente, vestiu-se levemente e deixou o abrigo opressor do lar.

Caminhava pelas ruas desertas sem rumo, ou preocupação, apenas grato pela liberdade de sentir a brisa noturna tocar a pele, transpassando o fino tecido da camiseta que o cobria seu torso. Não tinha ideia de por quanto tempo caminhara, nem mesmo que horas eram, apenas que passava das duas da manhã, e bem... talvez você saiba o que isso significa.

Ao olhar para o céu percebeu que as estrelas estavam mais brilhantes que antes, e se deu conta que adentrara o parque da cidade. Local muito bonito durante o dia, mas que à noite se tornava refúgio para aqueles que não tinham onde mais se abrigar. Não se incomodou, apenas continuou andando como vinha fazendo, por horas, provavelmente.

No meio do parque havia um lago, com peixes, cisnes e outros animais que gostavam dos alimentos arremessados pelos humanos. E em uma parte mais estreita do lago tinha um ponte alta e arqueada que conectava as duas margens. Foi ali que ele a avistou, ela parecia uma personagem de filme com aquele vestido longo azul celeste que parecia emanar luz própria. Fantasmagórica e linda.

Não se importou se poderia ser um fantasma, ou algum espirito, ou orixá. Apenas subiu a ponte indo na direção dela, como se uma força magnética o guiasse. Parou ao seu lado, ela olhava para o lago, calmo e escuro como uma extensão da própria noite. Em nenhum momento ela esboçou perceber a presença dele ao seu lado, mas ainda assim perguntou:

- O que aflige seu coração?

- Não sei ao certo. - Respondeu sobressaltado, tanto com a pergunta quanto com sua resposta rápida e honesta. - O que aflige o seu?

- Acho que seria mais fácil perguntar o que não aflige. O que você vê ao olhar pra este lago?

Ele olha pro lago, calmo e escuro, refletindo as estrelas do céu. - Água! - Responde.

- O que vemos não é a água, é apenas a superfície dela, o limite entre dois mundos, separando o caos interno do caos externo. Dentro do lago um mundo, fora dele outro. O que há dentro do seu lago?

- O que mais poderia haver além do caos? - uma curta e amarga risada emana de sua garganta.

Ela o olha pela primeira vez, e ele congela. Seus olhos são de um azul piscina tão intensos que parecem querer suga-lo pra dentro deles, sua pele branca parecia querer substituir a lua ausente com seu brilho, e emoldurando o rosto suave, longos cabelos negros como a própria noite. Ele sabe que ela o está examinando, e sabe que nem a muralha da China o protegeria daquele olhar. Ela o examina através da roupa, da carne, dos nervos, dos ossos. Ela lê a alma dele como se estivesse lento um banner qualquer, e ele sente sua essência estremecer sob aquele olhar.

- Se existisse uma resposta correta, essa provavelmente seria ela. - disse abrindo um leve sorriso que o desmontou por dentro. - Você teme o caos?

Dessa vez a resposta não veio rapidamente aos seus lábios. Ele encosta na beirada da ponte e olha mais uma vez para o lago. A superfície calma, escura, refletindo as estrelas sem entregar nada daquilo que que se passava abaixo, estariam os peixes dormindo? Haveria uma luta desesperada pela sobrevivência logo abaixo da plácida superfície? As infinitas possibilidades sem resposta para algo tão trivial quanto um lago à noite. - Sim... Não sei o que virá do caos... E isso pode me destruir.

- Sim, pode mesmo, mas sem o caos não há vida. O universo inteiro, desde as partículas de cada átomo até a dança eterna das galáxias, tudo é caos. Tudo está se destruindo para se reconstruir de uma forma diferente. 

- Então eu deveria deixar o meu caos interior me destruir?

- Não tem curiosidade de conhecer a si mesmo reconstruído?

Então se pegou imaginando, como seria sua versão reconstruído, após se destruir de dentro pra fora? Seria melhor ou pior que o seu eu atual? Será que as pessoas gostariam dessa nova versão? Será que o amariam? Será que ele se amaria?

Virou-se para ela, encontrando novamente aquele olhar que sabia muito mais sobre ele, do que ele mesmo. - Acho que tenho curiosidade, mas também tenho medo de me tornar outra pessoa.

- É impossível se tornar outra pessoa, você é o seu caos interior, seu novo eu seria apenas uma nova forma desse mesmo caos, seria você mesmo, sempre será, assim como o lago sempre será o lago. Você não precisa temer quem você já é.

"O lago sempre será o lago", Eu sempre serei eu. Era o que ele pensava enquanto fitava novamente o lago escuro, e fitava também o céu e percebeu que as estrelas começavam a se apagar, o negro da noite começava a recuar. O sol já vai nascer, quanto tempo fiquei aqui? E como se desperto pela luz do dia que se aproximava, se perguntou quem seria aquela linda mulher que o ensinara tanto. Olhou pro lado mas ela não estava mais lá, olhou ao redor e nenhum sinal dela. A quanto tempo ela partiu? Não saberia dizer.

Quando já começara a acreditar que estivera delirando, e que a mulher nunca existiu, avistou uma fina fita azul amarrada em seu calcanhar. Ela definitivamente não estava ali quando saiu de casa naquela madrugada. E soube ali que não sonhara, não foi uma alucinação, aquela mulher linda realmente estava ali com ele. Porém quem era ela? Seria uma mulher muito sábia, uma sacerdotisa de algum deus pagão antigo, uma santa cristã, um fantasma, um ser de outra dimensão, ou até mesmo um alienígena?...

Todo o resto de sua vida buscou a resposta pra essa pergunta, mas nenhuma de suas versões jamais obteve sucesso nisso.

 

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Negros e Selvagens

O borrão que passara nas bordas da visão era uma placa que indicava o quilometro daquele ponto da estrada, mas ele não a viu, não precisava ver, e nem queria. Apenas queria continuar sentindo o vento no rosto, sentir a jaqueta de couro repuxar ao cortar o ar a mais de 100 km/h em cima da sua Harley Davidson Fat Boy. E o destino? O próximo quilometro, a próxima curva, a próxima parada que a vida lhe mostraria.

Ao fim daquele dia, chegara a um destino. Uma pequena cidade costeira, com não mais de cinco mil habitantes. Marcada por uma pequena igreja no centro, a maior parte do comércio em volta e nas ruas adiante pequenas casas se somavam num curto espaço até acabarem num morro de vegetação densa. Pouco afastado do centro e mais próximo à estrada, se apresentava um posto de gasolina, com restaurante e hotel de aparência barata. 

Daniel parou sua moto no estacionamento do posto, e foi direto à recepção do hotel onde pediu um quarto. No quarto, apenas uma cama, uma TV de tubo pequena na parede e um ventilador de teto. Ele não se demora muito ali, apenas deixa a sua bolsa em cima da cama e vai para o restaurante. No restaurante há mesas de madeira com toalhas com um padrão xadrez de branco e vermelho, e um balcão com altos bancos de aço fixos ao chão. 

Daniel não está exatamente com fome, senta-se no balcão e pede apenas um sanduíche simples que devora com agilidade enquanto toma um suco artificial de maquina pra ajudar o sanduiche a descer. Alimentado, pede uma cerveja, o garçom o deixa com uma garrafa e um copo americano.

Talvez uma hora e duas garrafas depois, algo lhe chama a atenção. Uma moça em seus plenos vinte e poucos anos, pele num tom caramelo e olhos verdes, usando um vestido azul folgado, mas que lhe marcava as curvas com o vento. Mas o que realmente lhe chamou atenção foram os cabelos escuros encaracolados, caindo em cachos lindos e selvagens até as costas. Ao ver aqueles cachos ele pens... Melhor nem pensar...

A moça que reparara no olhar do forasteiro, resolveu se aproximar, afinal em uma cidade pequena como aquela não é comum aparecer tal tipo. Alto, forte, com cabelos castanhos lisos e bagunçados, uma barba da mesma cor lhe dava um tom misterioso, e ainda tinha certo estilo com a calça jeans que delimitava pernas fortes, um coturno e uma jaqueta de couro ao estilo motoqueiro.

- Oi! Novo na cidade? - Ela disse ao se aproximar e sentar no banco ao lado, jogando deliberadamente um cacho atrás da orelha.

- Apenas de passagem... - Respondeu Daniel, ele queria parecer mais seco, mas sentia o coração disparar.

- E para onde está indo? Se me permite a pergunta.

- Não tenho destino, estou apenas aproveitando a estrada.

- Hummm! Você é do tipo viajante então? Aquela moto lá fora é sua?

- Sim, é a minha moto...

Ao decorrer desse curto dialogo, Daniel percebe que a moça já se aproximou perigosamente, e o desejo latente entre eles já é palpável em cada gesto ou palavra. Simples assim, ele sabia o que aconteceria, e ela também sabia, e os dois queriam, a conversa não teria que se alongar muito. 

- Aliás, meu nome é Jamile. E o seu? - Ela diz enquanto coloca a mão sobre a perna dele.

Nesse momento, Daniel sente a sobriedade retornar à sua mente como um tiro. "Jamile, Jamile, Jamile, porque um nome tão parecido? E os cachos negros e selvagens? Não são tão bonitos quanto. E a mão na perna? no exato local que ela tocou quando nos conhecemos". Aquilo tudo foi demais pra Daniel.

Ele se levanta de repente deixando-a com uma cara assustada. Ele pede desculpas e diz adeus, sem nem olhar na direção da moça. E como que no piloto automático paga a conta e sai para a rua sem rumo. Logo avista um pequeno mercado ainda aberto, entra e compra um pack de cerveja. 

Já tomando a primeira cerveja do pack, ele continua a andar sem rumo ou direção. Mas a mente já o direciona para as coisas que ele não havia percebido antes, o cheiro da maresia, o barulho das ondas quebrando ao fundo, antes que percebesse Daniel já andava nas areias da praia, se dirigindo ao ponto mais vazio possível.

Daniel se sentou na areia, uma lua crescente iluminava a noite e se refletia no mar escuro, cortado pela espuma das ondas. "A lua logo estará cheia, ela ama a lua cheia..." esse foi seu primeiro pensamento ao  se sentar ali. Mas não foi o ultimo. Enquanto esvaziava uma cerveja após a outra, Daniel relembrou vários momentos que passaram juntos, momentos tão bons que ficaram gravados na alma. Começou a se perguntar o que dera errado, porque não estava com ela naquele momento. E se lembrou...

Uma gota caíra em em sua mão, olhou para o céu, mas viu apenas as estrelas e nenhuma nuvem, mas estava tudo turvo. Percebeu assim que estava chorando. Aquela lembrança doía demais. Queria poder ter uma máquina do tempo para voltar aquele momento, mas sabia que cometeria o mesmo erro milhares de vezes, era inevitável.

Tirou o celular do bolso, desbloqueou a tela e abriu o contato dela apenas para admirar a foto nova. Ela estava linda como sempre, olhos negros emoldurados em um rosto com bochechas rosadas e uma boca de lábios fartos que guardavam o sorriso mais lindo já visto, e os cachos, negros e selvagens despencando ao redor em uma harmonia caótica incomparável. 

Logo vieram todas as perguntas sobre ela, que rondavam a cabeça dele, a começar por "Ela está bem?". E a vontade de mandar uma mensagem pra ela só crescia. Mas ele apagou a tela do celular e o guardou no bolso. Sabia que não era o momento, que aquilo só a machucaria mais.

Voltou pro hotel e se entregou ao sono sobre os lençóis de aspecto duvidoso. Na manhã seguinte acordou com o canto do galo, se arrumou, tomou café da manhã e partiu. O próximo destino o esperava após mais algumas placas que passariam como borrões pela visão, mesmo ele não sabendo qual destino seria esse. 

Mas de certa forma, ele sabe qual serão os dois últimos destinos desta jornada. Sendo o último sempre a morte, o penúltimo será aquele único que ele pode chamar de lar, além da estrada. O lar onde ele sente a única coisa melhor que a sonhada liberdade. O lar que ele se arrepende de ter deixado pra trás. O lar que se encontra embaixo de cachos negros e selvagens...


terça-feira, 5 de janeiro de 2021

Devaneios Furados XVII

Um novo ano começou, e junto com o calendário muitas outras coisas também mudaram, ou estão em processo de mudança... Mas essas mudanças não estão acontecendo por causa do calendário, elas estão acontecendo porque eu resolvi mudar... Elas estão acontecendo porque eu precisava mudar... Tomar o caminho mais difícil, que sempre leva à mudanças, pra poder voltar a ter o tipo de vida que à muito se perdeu aos meus olhos... E a mudança no calendário, casou de forma até simbólica com a minha mudança pessoal... 

É engraçado como uma série de infortúnios, escolhas erradas, e algo que só posso categorizar como azar absoluto, me trouxeram até esse momento... Momento em que sou finalmente dono de mim novamente... Finalmente sou o senhor do meu destino, mesmo que a vida me leve na direção oposta a que eu quero... É sobre decisões... Eu estou no controle das minhas decisões... Até aquelas que me fazem perguntar o Porquê... Até aquelas que podem me levar à ruína... São 100% minhas novamente...

E assim eu vou iniciando um novo ano no calendário... Uma nova rotação ao redor do sol... 12 novos ciclos lunares... E junto com cada lua, muitas emoções... É um ano predestinado a grandes emoções... Algumas maravilhosas... Outras, agoniantes... Mas se tem um ritmo que estará presente nesse ano, são as batidas fortes e altas de corações... E que venham todas elas... Não tenho medo dessas emoções... Dançarei conforme a musica, sem perder de vista aonde quero chegar... Chorarei e sorrirei... Viverei, e estarei confortavelmente mais próximo da morte a cada dia... Pois o novo, é uma questão de perspectiva... Feliz Ano Novo...